O Já fui para... de hoje traz uma perspectiva diferente: a de uma empreendedora que viajou em busca de conhecimentos e escolheu como destino o Vale do Silício, a "Meca dos empreendedores de startups". Bem-vindos aos Estados Unidos!
Quem é você?
Sou Virgínia Rodrigues, tenho 24 anos e sou uma
empreendedora buscando trilhar um caminho de sucesso.
Porque você viaja?
Eu adoro viajar. Desde os 12 anos mais ou menos o meu
sonho era fazer um intercâmbio. Eu acredito que este gosto por viagens eu
aprendi com os meus pais, que sempre levaram o meu irmão e eu junto com eles em
viagens, mesmo quando éramos crianças. Então desde pequena eu aprendi a acordar
cedo, tomar um super café da manhã e explorar uma cidade sem saber quando
pararíamos para almoçar e a não ver isso como um problema, já que tínhamos
aquele dia para explorar um lugar novo. Por isso que eu gosto de viajar. Não é
só explorar um lugar novo, mas saber como eu vou ser neste lugar.
Porque você escolheu os Estados Unidos?
Os Estados Unidos foi por um acaso, assim como a Alemanha
(onde eu fiz um intercâmbio em 2012) também foi. No fundo, de toda uma lista de
países que eu queria conhecer na vida, Estados Unidos e Alemanha estavam em
último lugar, por preconceitos pessoais. Mas oportunidades apareceram para mim
justo nestes lugares. A primeira vez que eu fui para os EUA foi em setembro de
2013, quando uma amiga que eu conheci em Florianópolis me convidou para passar
três semanas na casa dela e conhecer mais sobre o Vale do Silício. Naquela
época eu estava abrindo a minha primeira startup e queria muito conhecer mais
este cenário. O Vale do Silício ainda é a “Meca dos empreendedores de
startups”, então eu resolvi ir para lá. Eu acabei conhecendo a região da Bay
Area e me apaixonei por San Francisco, que é a maior cidade desta região. É
muito linda e eu gosto muito.
Qual a maior dificuldade que você enfrentou?
Eu acho que na segunda vez que eu fui para San Francisco,
que eu passei 4 meses, a minha maior dificuldade foi fazer amizades. Eu me
surpreendi com isso, porque eu já fui para lá conhecendo algumas pessoas, e
como eu já tinha feito um intercâmbio antes eu achei que tudo ia fluir super
bem. Mas quando eu fiz o intercâmbio para a Alemanha todos eram estrangeiros,
então tínhamos aquele laço em comum por não termos a nossa referência de casa e
de amizades, o que fazia com que nos conectássemos muito mais rápido. Só que quando
fui para San Francisco, eu estava me conectando com pessoas que já moram lá e
que vão ficar por muito mais tempo, e que sabiam que eu só estaria lá por
alguns meses. È mais difícil você fazer uma conexão mais significativa com
estas pessoas logo de cara. Mas no último mês, quando eu já estava quase
completando quatro meses na cidade, eu encontrei bons amigos e pessoas que eu
tenho saudades agora e quero rever. Foi um dos meus maiores aprendizados.
Descobri que estas conexões levam tempo e exigem dedicação. Você vai encontrar
várias pessoas de vários lugares. Com algumas a afeição será imediata e com
outras não, mas isso faz parte do processo. É muito diferente de um intercâmbio
onde você se relaciona com outros estrangeiros. Desta vez a minha conexão era
com locais – ainda que os locais que já moram em San Francisco há muitos anos e
com os quais eu fiz amizades são todos estrangeiros também, de países bem
diferentes. Um libanês, uma romena, um australiano, um indiano... então no
final das contas eu me relacionei com os estrangeiros de novo.
Sábado a tarde em Dolores Park, San Francisco |
O que você mais gostou?
Eu acho difícil dizer o que eu mais gostei nos Estados
Unidos. É um país imenso, assim como o Brasil, e com muitas diferenças
culturais, então eu não posso generalizar. Nos EUA eu só tive a chance de
conhecer a região de Chicago, San Francisco e as cidades ao redor da Bay Area,
na Califórnia. Então eu posso falar mais sobre o que eu gostei de San
Francisco. Eu me encaixei muito bem nesta cidade. O que eu mais gostei foi o
fato de as pessoas serem super ecléticas. A minha sensação é a de que aquela
região é o epicentro de muita coisa que acontece no mundo acerca de tendências
e inovação. E não só em termos de tecnologia, mas no que envolve arte,
comportamento e inovação no geral. Eles brincam que San Francisco é a cidade
dos “misfits”, porque todo mundo que não se encaixa de alguma forma vai para
san Francisco e lá acaba se encontrando. Tem muito maluco na cidade, e me
refiro tanto a louco mesmo quando àqueles que não se encaixam e querem fazer as
coisas de maneira diferente e mudar o mundo. Eu gostei muito deste espírito das
pessoas. E eles são muito liberais, então é muito raro que você encontre um
comportamento de julgamento. 60% da população de lá é composta por imigrantes
ou filhos de imigrantes, então você encontra muitas comunidades lá dentro e
todo mundo acaba sendo um pouco mais aberto, porque eles entendem que a gente
vem de outro contexto e não fazem pré-julgamentos logo de cara.
Quanto à questão cultural, teve algo difícil para você se
acostumar?
Teve gente que me perguntou se a questão da alimentação
foi difícil, mas para mim não foi. San Francisco é uma região que preza uma
alimentação bem saudável com muitos produtos orgânicos, muitas pessoas são
vegetarianas, então a alimentação é muito boa, muito rica. Como tem vários
tipos de restaurantes você não tem aquela concepção de que é só hambúrguer e
batata frita. Eu também gosto de provar coisa diferente, então para mim foi
muito bom. Uma questão cultural mais diferente é que os americanos são bem mais
diretos, diferente dos brasileiros, que no geral dão voltas antes de falar a
sua opinião, porque temem levar para o lado pessoal. Lá não, eles tem isso bem
separado. Se vão fazer uma crítica, é sobre o teu negócio, sobre o teu projeto,
ou é um aviso sobre um comportamento de outra pessoa que eles não querem que se
repita. Eles conseguem falar isso e deixar claro de uma maneira que seja
educada, direta e tranquila. No início você se choca um pouco, pensando que é
pessoal, mas depois você vê que há uma certa separação. Depois de um tempo você
acostuma e acha até bom este hábito. Acho que em termos de negócios e estudos é
muito benéfica, porque as coisas avançam, todo mundo consegue falar no mesmo
tom e progredir.
O que você não imaginava que iria encontrar ou que iria
acontecer lá, e acabou acontecendo?
Já que o meu foco era o empreendedorismo, eu não imaginei
que fosse encontrar pessoas incríveis, de alto escalão, que me permitissem
conversar na boa, de igual para igual. Isso me surpreendeu. Eu também conheci
muito brasileiros incríveis, que não necessariamente moravam no Vale mas
costumam viajar para lá, e que trabalham com startups aqui no Brasil e são
referência no país. Se eu estivesse no Brasil seria muito mais difícil de
encontra-los, porque temos uma distância geográfica imensa. Eu não moro em SP,
então eu acho que demoraria muitos anos para conhecê-los, algo que aconteceu em
semanas em San Francisco.
Como são as pessoas?
Uma coisa que eu me dei conta nestes quatro meses foi que
nós esquecemos que os EUA também é um país de imigrantes. A gente tem uma
imagem do americano como aquela pessoa loira, alta, alguns com sobrepeso... mas
no geral é a imagem que Hollywood exporta. E a gente esquece que tem uma
comunidade imensa de mexicanos, de italianos, de irlandeses, de chineses, de
coreanos, e por aí vai. Eu acho que desta vez eu consegui ver com mais clareza
o quão misturado é este povo, assim como é o Brasil. Acho que a maior diferença
entre os países é que nós nos misturamos mais, e lá as comunidades se mantêm
mais separadas entre si.
Qual a sua visão sobre o nacionalismo?
Eu acho que varia de uma região para a outra. No dia 4 de
julho, dia da independência dos EUA, eu estava em Chicago. Lá tem grupos bem
mais segregados, e você vê características americanas de ser bem particulares.
Em San Francisco você não vê tanto isso, porque as pessoas se misturam um pouco
mais. Então eu acho difícil falar sobre o quão nacionalistas eles são, porque
eu fiquei muito mais tempo em uma região que abraça bastante gente que é de
fora. Se eu passasse mais tempo em Chicago, talvez eu conseguisse ver e
entender um pouco melhor esta questão. As pessoas desta região também são muito
mais críticas em relação ao país, elas reclamam do sistema de saúde pública,
que é praticamente inexistente, e reclamam pelos seus direitos. Então eu vi
pessoas muito críticas, não são nacionalistas “cegos”, fechados no mundo deles,
ou que não enxerguem problemas no país. Eles também se mostraram bastante
críticos em relação às questões de espionagem feitos pelo governo, até porque
são os primeiros a serem espionados.
Que outros lugares do país você gostaria de ter
conhecido? Algum roteiro fora do tradicional para sugerir?
A Califórnia é um lugar lindo, tem muitos parques
nacionais incríveis. Eu ainda não fui para Yosemite, nem para Lake Tahoe, e
quero muito ir a estes lugares. Eu quase não acredito que eu voltei de lá sem
ter tido a chance de conhecer. Outro lugar que eu quero conhecer melhor é Big
Sur, que é muito bonito também. Um lugar totalmente diferente que eu tive a
chance de conhecer e que eu gostei bastante foi Death Valley, o vale da morte,
que é um deserto no sul da Califórnia. Foi algo que eu nunca tinha visto antes
e acho que não temos parecido aqui no Brasil. Gostei das formações rochosas,
das montanhas e de sentir um calor em que o suor evapora antes que você se dê
por conta, e a pele fica toda salgada. Foi uma experiência muito diferente como
um todo, e este é um lugar que eu sugiro visitar. Yosemite todo mundo vai ou
ouve falar, é super famoso. Mas quem é um pouquinho mais aventureiro talvez
goste de Death Valley. E tem muita trilha bonita para se fazer lá.
O Vale do Silício é um lugar fácil para quem não conhece
se achar?
Uma coisa que as pessoas pensam com relação ao Vale do
Silício, como eu também pensava, é que as coisas são todas perto umas das
outras. As cidades são relativamente perto, mas tem que considerar que tem
bastante trânsito entre o norte da Bay Area, onde fica San Francisco, até o
sul, onde fica San Jose. É entre estas duas cidades fica a área do Vale do
Silício. Nesta região ficam as cidades de Melo Park, Sunnyvale, Palo Alto,
Mountain View... e é onde você vai encontrar a maioria das startups. Em
Mountain View tem a aceleradora 500 startups e o Google, em Melo Park é onde
está o Facebook, mais para o centro de San Francisco tem o Twitter, em San Jose
tem o PayPal e o eBay, então são grandes empresas espalhadas por estas cidades.
E eu acho que as pessoas esquecem que existe uma distância física considerável
entre um lugar e outro. Dirigindo em uma hora de rush dá uma hora ou uma hora e
meia de viagem entre San Jose e San Francisco, por exemplo. Eu considero uma
região fácil de se achar, mas não é de fácil transporte. Dentro de San
Francisco tem transporte público. Você pode pegar o caltrain, só que ele não
vai levar você até o seu destino, aí você tem que pegar um táxi. O ônibus é
mais demorado e eu nunca tentei pegar lá, o sistema não é tão bom. De um
caltrain até a sede do Google, por exemplo, são quase U$$20, e não dá para
ficar gastando isso o dia inteiro todos os dias. Além disso, o sistema de táxis
lá é péssimo, eu não recomendo, o taxista às vezes nem aparece. Então o aluguel
do carro é uma opção pela facilidade da locomoção e pela diminuição dos custos
com táxi – ainda que seja difícil achar lugares para estacionar. Isso são
coisas que as pessoas só vão ter conhecimento quando chegam lá, mas é bom ir
preparado para isso.
Death Valley, CA |
Você teve alguma surpresa em relação ao país? Algo que
você sempre achou que fosse de um jeito e quando chegou lá viu que era de
outro?
Uma das razões pelas quais eu nunca quis ir para os EUA
foi a de que eu achava que eles teriam uma mente muito fechada, e por serem
muito ufanistas não seriam abertos aos estrangeiros. Então acho que eu sempre
tive medo de ir para lá e sofrer preconceito. Só que quando eu fui para San
Francisco eu fiquei surpresa por ser uma comunidade bastante internacional,
muito mais aberta e educada. Mas falo da região de San Francisco, não sei como
seria se tivesse ido para alguma região mais para o interior do país.
Que dicas você daria para a chegada na imigração?
É importante lembrar, principalmente no caso de mulheres,
que se você é solteira, recém-formada, empreendedora, você acaba caindo em uma
categoria de mulheres que vão para lá e que ficam ilegais. Então por mais que
você não esteja indo para os EUA com a intenção de se tornar ilegal, é preciso
entender que você vai cair dentro desta categoria, e vai ter grandes chances de
ser parada na imigração para fazer uma entrevista mais extensa. O que acontece
é que o visto só te dá direito a chegar até a porta de entrada dos EUA, e a
partir daí é o agente da imigração que vai decidir se você pode entrar ou não.
Este visto que eu tenho, que é o B1/B2 (B1 para turismo e B2 para negócios, com
o qual eu posso fazer entrevistas, reuniões, ir a cursos e palestras), permite
que você fique até no máximo seis meses dentro do país. Para eles duas ou três
semanas faz sentido, mas depois deste tempo o questionamento é sobre como a
pessoa vai se sustentar. É importante deixar bem claro qual a sua fonte de
renda, o que você faz para se sustentar, com quanto dinheiro você está entrando
no país, o que você vai fazer lá, por quanto tempo você vai ficar, sempre
mostrar a passagem de volta e nunca mentir. Tem gente que às vezes acaba
ficando nervosa e omitindo algumas informações, e eu não sugiro que isso
aconteça, já que eles mantêm tudo o que você diz registrado no sistema deles. E
se você quiser voltar outra vez e contar outra coisa, eles começam a achar a
sua história estranha. Então pode ser que eles te mandem para uma segunda sala
e façam uma entrevista e te encham de perguntas. Claro, também depende muito do
agente que está falando com você, que algumas vezes pode ser mais educado e em
outras não. O negócio é manter a calma, responder aquilo que eles perguntam e
não falar além do necessário. Se você está falando a verdade e explicando a
real intenção pela qual você quer entrar no país, fica tudo bem e você entra
sem problemas. É importante estar preparado psicologicamente para o fato de que
você pode enfrentar isso. Para homens não é tão difícil, mas para mulheres é
importante manter isso em mente e ir preparada.
A Virgínia está organizando um blog sobre
empreendedorismo. Assim que estiver pronto eu divulgo aqui no post. ;)
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